terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

O AMOR



os caminhos percorridos pela memória são muitos. bem como as nossas reações a ela.

desperto da imersão em um ótimo livro que estou lendo, 'acordado' pelo meu olfato.
sensação estranha.

é o cheiro da minha infância?
é o cheiro de um monte de coisas que fui, que senti, que experimentei.
cheiro da minha coragem de quando criança.
de repente tão distante do que me tornei.

reparo que o cheiro vem, claro, da cozinha.

mas a funcionária da casa é nova... que cheiro é esse?
é um cheiro cheio de tanto sentimento...

em um salto, vou em direção à cozinha... matar a curiosidade, com o coração já cheio de emoções misturadas!

na cozinha, minha avó, aos 94 anos, fazendo o meu doce predileto da infância.

voltei devagarinho para sala, para não chorar na frente dela.

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

O MUNDO DA MARGARINA


         
         Não  fiz objetivamente promessas para 2013. Tenho feito algumas há tempos e, por essa razão, acabei chegando ao dia 31 meio exaurido para novas resoluções. O ano de 2012 foi excelente e, no fim dele, deixei o 2013 meio livre. 

            No dia 31 de dezembro pensei sobre os votos, os desejos mútuos de um ano cheio de coisas boas. Tudo muito politicamente correto, o que não necessariamente é falso. Adoro a festa, os fogos, o mar, pular as sete ondas, comer isso e aquilo, beber champanhe, abraçar os afetos, mas... posso fazer isso sempre que eu quiser.

            O que me ocorre pensar, em síntese, é que estar em determinados lugares hoje em dia, não é mais uma experiência e sim uma aparência. Aquela aparência de felicidade que você talvez consiga mostrar no Instagram ou no Facebook, por exemplo. E que, só a partir disso e por isso, é que vai acabar fazendo algum sentido para você. 

            O disfarce da realidade transforma o mundo real em um mundo da margarina. Assim como uma foto trabalhada no Photoshop, a realidade está sofrendo alterações significativas que partem das distorções da realidade feitas por nós mesmos. Basta que vejamos as fotos: quase impossível alguém não estar sorrindo. 

            Quando olhamos mulheres e homens “impossíveis” em revistas, pensamos: eles não são reais, tem efeito aqui, tem uma puxada ali, esqueceram de colocar o umbigo, etc. Mas, inconscientemente, mesmo assim, é esse o modelo que buscamos. Agora, estamos fazendo essa mesma movimentação que antes se resumia ao corpo, no cotidiano também. 

            Vidas impossíveis que se legitimam através do olhar alheio. Estar em um show só faz sentido se todos souberem que estamos no show. Estar deitado na rede em uma praia linda qualquer só fará sentido se rolar aquela fotinho cheia de curtidas. E se não curtirem? Será menos prazerosa a sensação do desfrute.

            Não é por acaso que as grandes Google e Facebook estejam cada vez mais investindo em políticas de privacidade. Mas deve ser complicado lidar com este antagonismo: quero me mostrar versus não quero que me vejam. Aliás, para qualquer empresa ou pessoa física é complicado lidar com a hipocrisia.

            Para 2013, então, não fiz promessas. Quero tão somente que a minha vida seja mais real. O ano muda, de 2012 para 2013, quem muda o resto somos nós. 

(A foto é do Miguel Rio Branco)