terça-feira, 31 de agosto de 2010

CORTINAS E MÚSCULOS



Às vezes sinto saudades de escrever, seja lá o que for. Mas acabei tornando-me tão crítico comigo mesmo que parei, não escrevo mais. Nem lembro a última vez que escrevi um poema (tirante hoje, claro), essa parte da minha vida ficou muito associada à Carmo, uma grande e especial amiga com a qual produzi muitos escritos conjuntos.

Aliás, pensando melhor, acho que muito devido ao falecimento da Carmo foi que deixei a escrita de lado. Pensar em escrever ou conectar-me com meu lado sensível é entrar em contato com ela e, claro, sentir a dor da saudade.

Mas hoje acordei com vontade de escrever algo. De colocar para fora alguma coisa em forma de poema. Não interessa se gostei ou não, se é bom ou não, hoje me dei essa folga.

Cortinas e músculos

Restos, farelos
Marcas de dedos nos vidros
O ralo está com cabelos
E o lixo por ser tirado

O que meu silêncio quer dizer
É que o sol some atrás das nuvens
Mas continua

Feridas, buracos
Esperas
Botões que caíram
Sapatos gastos de tanta caminhada

O que não sabem de mim
É que nem tudo que some finda
E que encolho os dedos dos pés
Quando sento

Vinagre, maçãs
Folhas verdes de rúcula
Tudo se necessita, se interliga

O que se quer afinal explicar
É que a tesoura é um bem em si
Mas não se pode defini-la
As coisas não se resumem aos seus fins

A foto lá em cima só poderia ser do meu predileto Henri Cartier Bresson, ok? Boa semana a todos e todas.

sábado, 21 de agosto de 2010

O QUE FAZER COM O CONHECIMENTO?


Ando meio sem tempo. Já postei sobre isso e nem pude escrever. Às vezes tenho a sensação de que 24h não serão suficientes nem mesmo para eu sentir um pouco de preguiça. Não estou reclamando. Este ano tem sido maravilhoso e, talvez justamente por isso, muita coisa tem acontecido com o meu tempo. Agora mesmo estou envolvido com um artigo que me meti a escrever: estou fazendo um paralelo entre a Genealogia da Moral, uma polêmica (de Nietzsche), a vida de Oscar Wilde e o Direito Penal brasileiro.

Quero evocar a crise contemporânea do Direito Material Penal através da filosofia e da história. Desejo falar da ética, da moral e do Direito, bem como sua pluralidade de conceitos. Para isso tenho contado com a ajuda de pessoas sensacionais e a compreensão dos meus poucos amigos.

Minha ideia em produzir algo assim vem ao encontro do desejo que tenho de fazer alguma coisa com o meu conhecimento. Tentar, através dele, passar algo que sirva socialmente para uma reflexão minimamente elaborada. Mas, claro, isso toma tempo, energia, mas no fim é bacana! Além do mais, mergulhar na vida de Wilde e derramar-se de Nietzsche pode até ser áspero às vezes, mas é extremamente interessante e enriquecedor. Deparar-se com a nossa realidade penal, problematizá-la, compreendendo falhas ou reconhecendo aspectos positivos é bastante empolgante. Falar sobre o Direito Penal é, também, falar sobre uma filosofia do castigo.

Que bom que meu trabalho possibilita isso e permite que, de alguma forma, eu busque provocar a sociedade para que a mesma se movimente. A Faculdade de Direito da Fundação do Ministério Público através de um corpo docente impressionante me deu, também, muito estímulo para trabalhar com esse viés humanista do Direito. A Dra. Betânia Moraes Alfonsin, o Dr. Anízio Pires Gavião Filho, o Dr. Plauto Faraco de Azevedo, o Dr. Eduardo Carrion, o Dr. Mauro Fonseca Andrade e o Dr. Fábio Sbardellotto são alguns exemplos de pessoas com as quais eu tenho o privilégio de conviver e que me fazem querer ser melhor e buscar o meu melhor.


Foi uma postagem longa, né? Os “manuais” de boas postagens mandam escrever o mínimo possível. Um BLOG para escrever o mínimo possível? Para isso já há o Twitter. Eis a sociedade pós-moderna, como diria Boaventura de Sousa Santos, em que o menos tornou-se mais e onde reverencia-se cada vez mais a alienação, a estupidez e o descartável.

Encerro anunciando que em Porto Alegre o tempo está impecável. Setembro aproxima-se. O céu está limpo, a temperatura sensacional e a lua enchendo.

Fernando Pessoa:

Para ser grande, sê inteiro: nada
Teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa. Põe quanto és
No mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda
Brilha, porque alta vive.

Ricardo Reis, 14-02-1933.

Os quadros que compõem essa postagem são do Picasso.

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

O ETERNO WALY SALOMÃO


Devenir, devir

Término de leitura

de um livro de poemas
não pode ser o ponto final.

Também não pode ser
a pacatez burguesa do
ponto seguimento.

Meta desejável:
alcançar o
ponto de ebulição.

Morro e transformo-me.

Leitor, eu te reproponho
a legenda de Goethe:
Morre e devém

Morre e transforma-te.

O Waly foi um destes homens raros, cheio de poesia. Quando falava, era seu corpo todo que se manifestava em uma dança confusa de gestos e verbos. Um homem sensacional que volta e meia retorna a minha cabeceira. Hoje reencontrei esse lindo poema dele, que saudade!

Leiam, também, essa composição do Waly com o Macalé, chama-se Mal Secreto:

Não choro,
Meu segredo é que sou rapaz esforçado,
Fico parado, calado, quieto,
Não corro, não choro, não converso,
Massacro meu medo,
Mascaro minha dor,
Já sei sofrer.

Não preciso de gente que me oriente,
Se você me pergunta
Como vai?
Respondo sempre igual,
Tudo legal,
Mas quando você vai embora,
Movo meu rosto no espelho,
Minha alma chora.

Vejo o Rio de Janeiro
Comovo, não salvo, não mudo
Meu sujo olho vermelho,
Não fico calado, não fico parado, não fico quieto,
Corro, choro, converso,
E tudo mais jogo num verso
Intitulado
Mal secreto.